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O trono

As poltronas eram um símbolo de poder e riqueza nas sociedades antigas, reservadas para os reis e outros membros da nobreza. Em cidades agrícolas e com poucas opções de mão de obra, os artesãos que faziam móveis domésticos que se limitavam a formas simples e as casas eram mobiliadas apenas com bancos, mesas e camas, e no máximo, cadeiras de encosto. Foi com a chegada da industrialização que peças começaram a ser produzidas em larga escala e com valor acessível, dessa forma era possível aumentar o repertório de itens que mobiliavam uma casa camponesa, e assim, começar a imitar as formas que eram utilizadas pela nobreza.

Apesar de ter se tornado um objeto de decoração muito mais comum na casa moderna, a poltrona ainda resguarda sua ideia inicial de lugar individual de conforto, diferente de sofás que socializam e compartilham o espaço. A poltrona ainda mantém a soberania daquele que a utiliza, talvez seja por isso que elas viraram grande objeto de destaque do design e nomes famosos do mundo da arquitetura quiseram ter seus próprios modelos assinados, pois apesar de ser apenas mais um mobiliário ela ainda é a linha direta entre o arquiteto e o usuário único e singular, como se ao sentar-se você pudesse pegar para si todo o pensamento por trás daquela peça e usá-lo a seu bel prazer sem precisar compartilhar.

Existiram também diversas maneiras de pensar cadeiras e poltronas, Lina Bo Bardi, a brilhante arquiteta que projetou o Sesc Pompéia e o MASP, ressaltava a importância da rigidez do mobiliário para que o usuário sentasse com uma posição ereta e elegante, claramente essa ideologia não era compartilhada por Sérgio Rodrigues quando desenhou a poltrona Mole que te abraça como se fosse te engolir. Isso mostra como foi importante a discussão de conforto e ergonomia entre os arquitetos, pois não apenas era uma forma de estampar sua marca e sua visão de design em um mobiliário de uso individual, mas também resumia todo o pensamento de como aquela pessoa entendia uma das atividades mais prazerosas do nosso cotidiano: o descanso.

E apesar do mundo ter mudado muito e as casas terem se transformado de tamanho, espaço e disposição, ainda achamos diversas formas de incorporar o descanso dentro do lar, casualmente costumam aparecer em cantinhos de leitura, com mesas laterais, mantas, tapetes e luminárias indiretas, reforçando a ideia do conforto da peça, porém quando falta canto dentro da casa ela pode ocupar outros espaços, como o teto, e resinificar totalmente a ideia de repouso.

A grande dualidade dessa questão é que para acessá-la é preciso subir uma escada na parede, tarefa nem sempre tão confortável, porém que se justifica ao chegar no topo e poder se estirar numa rede suspensa que olha para o horizonte paulistano que emoldura a varanda. Novamente, apenas uma pessoa cabe aqui, não dizendo que duas não possam usá-la simultaneamente, mas é pensado para que alguém tenha o seu momento, o seu descanso, a sua leitura e isso é ainda mais interessante ao tirá-la do piso, porque é evidenciado a importância de se ter um tempo individual ainda que o espaço não comporte tantos cômodos, como é o caso desse estúdio específico. Por fim, é inegável que ela ainda é uma forma de representar o poder, mas não o poder soberano e nobre como outrora foi, mas sim o poder estar sozinho, poder descansar, poder ser a própria companhia, porque a poltrona nada mais é, do que nosso próprio trono.


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