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O espaço


A discussão sobre o que é mínimo não é tão recente quanto parece, desde a consagrada Bauhaus, no nascimento do movimento moderno, que se discute sobre o conceito de minimalismo com a icônica citação de Mies van der Rohe de que “menos é mais”. Contudo o menos daquela época se resumia a decoração e ornamentos em construções colossais, a própria Villa Savoye, suprassumo da obra modernista projetada por Le Corbusier em Poissy, na França, uma magnífica casa de veraneio com três pavimentos.

Com a virada do século e, principalmente, depois de quase dois anos dentro de casa, renovamos drasticamente o conceito de mínimo necessário. Atualmente São Paulo, assim como outras capitais no Brasil e no mundo, é lar de diversos estúdios de pouco mais de vinte metros quadrados, frutos de uma cidade com muita gente morando e precisando de espaço para todos, contudo o novo desafio da arquitetura é provar que esses meros dois cômodos podem abrigar todas as funções do morar com plena tranquilidade, o aliado dessa discussão agora não é mais a estética ou a pureza de materiais, mas sim a funcionalidade e a criatividade.

O espaço comunal vira o coração da casa, dormir, descontrair, comer e trabalhar, após o grande aumento do home office, passam a compartilhar o mesmo salão que precisa não mais de um espaço individual para cada uma das funções, mas sim entender a forma como elas se organizam ao longo do dia. A cama retrátil desce sobre um sofá sem braços, permitindo uma noite tranquila de sono, porém com o raiar do dia ela vira um painel e a sala ganha um espaço de sentar, assim como a cortina que, para ocupar menos espaço, é instalada no vão da porta, usando da edificação como suporte e não perdendo o conforto de um quarto escuro durante todo o sono. Os armários também não guardam apenas roupas, eles compartilham seu espaço com tudo aquilo que precisa de armazenamento em portas que emolduram o grande bloco de marcenaria, esse móvel é quase que um coração que bombeia para o apartamento os nutrientes necessários para cada hora do dia.

Já a cozinha passa a ser o grande dilema desse tipo de apartamento, a rotina moderna aliada à tecnologia já não precisa mais de grandes salões para o preparo de alimento, muito menos de edículas afastadas por conta do mau cheiro, depuradores não apenas são aliados para que o travesseiro não tenha o cheiro do almoço pelo resto da semana como também se integram na marcenaria sem interrupções visuais, as gavetas também se subdividem internamente para garantir que tudo pode ser estocado sem perder o desenho limpo da marcenaria e a mesa de refeições, uma importante extensão da bancada, serve como apoio no preparo de alimentos e também mesa de trabalho, basta mudar o que se coloca sobre ela. Pensando ainda no advento do home office, é preciso lembrar que agora o fundo da mesa de trabalho é tão importante quanto o espaço de apoio para o notebook, nossas interações com colegas são constantemente emolduradas pelo que se vê atrás de nós durante as chamadas de vídeo e, por isso, a geladeira ganha uma cortina de cordas que garante um aspecto mais interessante para o cenário, para um modernista purista pode ser puro ornamento mas para o século XXI nada mais é do que a forma de mostrar criatividade e atenção a todos os pontos do lar para que ele sirva efetivamente como uma casa multifuncional e não apenas um emaranhado de atividades.

A varanda assume um papel importante também, o respiro verde dessa casa compacta com uma bela vista é fundamental para pausas, tomar um ar ou só ler um livro, atividade que também é executada na poltrona de rede que fica suspensa, aproveitando o pé direito alto. No fim, o modernismo se mostra na ocupação de todos os espaços disponíveis da forma mais criativa, quando o piso não basta nos apegamos às paredes e, quando essas são insuficientes, vamos para o teto.

Ainda que eu mencione que a pureza dos materiais não seja mais o fundamental da doutrina moderna é equivocado dizer que ela não é pensada como elemento de projeto. Em um espaço tão compacto a unanimidade e linearidade de elementos é fundamental para a ambientação, queremos, afinal, aconchego e não caos, por isso as linhas retas são muito bem marcadas, assim como os planos de cores e o respiro que os móveis têm ao não chegar no teto alto, tudo isso meticulosamente pensado para que a casa compacta não apenas funcione plenamente em todos os seus atributos, mas para que seja, em seu cerne, um lar.

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