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A sociedade demorou um bom tempo para reconhecer a cor azul, isso porque diferentemente do verde, vermelho, amarelo e outras cores comuns do nosso cotidiano o azul não é abundante na natureza e, fora algumas flores e animais que tenham coloração azulada, os únicos grandes elementos azuis que as sociedades primitivas tinham contato eram o céu e o mar e, dada suas magnitudes, era difícil entende-los como algo tangível.

Atualmente já se conhecem as propriedades psicológicas da cor azul, que além de se relacionar com coisas geladas por ser uma cor fria também é responsável por proporcionar paz e tranquilidade, sendo muitas vezes uma cor predominante em quartos de dormir. Essas percepções também fazem parte do nosso instinto de sobrevivência, fazendo com que sintamos estranheza e repulsa por alimentos de coloração azulada, por exemplo. Portanto, já podemos assumir que o azul virou apenas mais uma cor na nossa paleta contemporânea, mas por que ele ainda é tão fascinante?

Apesar de ter virado uma cor cotidiana ainda paramos para observar um céu azul ou um mar no horizonte, também temos nossa roubada quando encontramos pássaros ou borboletas de tons azulados chamativos, isso porque essa cor nos passa uma sensação de magnificência, exatamente por estar relacionada com as maiores coisas que conhecemos enquanto seres humanos, o céu e o mar.



Sendo assim, o azul é mais do que apenas a cor que vai nos proporcionar um ambiente aconchegante para relaxar depois de um dia cansativo. Sua ausência na natureza lhe dá uma característica mais rara que desperta a curiosidade humana, basta pensar na estranheza que o filme Show de Truman causa quando Jim Carey chega até o final do céu e aquilo que parecia imenso do nosso ponto de vista acaba tendo um limite (isso sem contar todas as outras estranhezas que esse filme aborda). Portanto, ainda fica um questionamento pendente: como o azul pode ser tão aconchegante sendo uma cor tão fria? E isso não apenas por ser, de fato, uma cor fria, mas simbolicamente o calor e o frio são representados por vermelho e azul, respectivamente, portanto apesar de ser apenas mais uma cor fria o azul simboliza o frio por si só e, ainda assim, encontramos tanto aconchego nele.


Talvez a resposta desse dilema está, exatamente, na relação de oposição que temos com essa sensação. Ao pensarmos em um ambiente frio, como um iglu ou uma cabana em um vale nevado, automaticamente complementamos a cena com outros elementos como uma lareira, mantas, chocolate quente e roupas de lã, portanto o aconchego não está no cenário em si mas na decoração que complementa a paisagem mental que formamos ao pensar nessa situação quase que inóspita. Com o azul é o mesmo, porque mesmo que seja uma cor fria ela é complementada pelos mesmos aconchegos citados acima, ou então sua frivolidade é reforçada ao ser relacionada com um mar refrescante em um dia de verão e um dia de sol na praia.

Por isso que azul é uma das cores mais interessantes, na minha opinião. Sua raridade abre espaço para relações muito mais complexas do que outras cores, como o verde, vermelho e amarelo e isso cria uma aura que pode ir do psicológico ao espiritual para tentar entender por que o azul chama tanto nossa atenção

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Atualizado: 29 de jun. de 2022

Recentemente me mudei para um apartamento novo no qual não tinha número na porta. Provavelmente deve ter caído com o tempo, ou algum proprietário tirou por alguma razão estética ou cabalística, acontece que ainda sendo muito simples achar o apartamento dezoito apenas seguindo a sequência de portas no corredor sempre existe um certo receio das visitas em tocar minha campainha na primeira vez que vêm a minha casa. Por isso decidi pendurar uma foto da minha família na porta, nela estou e meu namorado junto da nossa gata, Pisco, parecendo um pãozinho preto com olhos amarelos e apenas uma orelha.





Com isso me perguntei como seriam as outras famílias desse prédio, afinal conheço poucos vizinhos, mas já vi diversas configurações de famílias morando num apartamento igual ao meu. Existe a mãe que mora com duas filhas no meu andar e a família de colegas de faculdade que dividem apartamento no andar de cima, tem uma família de namorados que se dividem entre São Paulo e Rio de Janeiro no quinto andar e a família de um casal com o cachorro Joaquim que sempre me cheira quando nos trombamos na entrada do prédio. É interessante pensar como essas tantas famílias vivem, comem, dormem e compartilham o espaço que eu compartilho com o Guilherme e a Pisco, algumas delas dividem quarto, algumas têm camas de pets, alguns pets dormem embrulhados na cama de casal (nesse caso, a Pisco), algumas fazem refeições na mesa e outras em videochamada com quem está longe, tudo isso nos mesmos cinquenta metros quadrados que eu moro.



Porém não sei se uma família é meramente composta por quem vive junto, acho que existe um laço a mais que torna um grupo familiar ou não, é um afeto embrulhado com cuidado e com uma pitada de preocupação, por isso que a nossa família vai se dividindo em casas, cidades, estados e países e se num dia estamos tomando vinho juntos na mesa no outro estamos cozinhando enquanto fazemos uma videochamada para a Noruega. Mas apesar de tudo isso, muito se fala que o lar é o lugar de reunião da família, então outro questionamento me surge: como tantas famílias diferentes fazem para se encontrar?

Apesar das telas que juntam os que estão longe acredito que todo lar tenha seu espaço de reunião da família, seja na mesa redonda cheia de pratos ou no sofá cama que abriga uma mãe e uma irmã espremidas durante um fim de semana, nas encostados nas paredes da cozinha enquanto se prepara o almoço de domingo ou todos deitados na mesma cama de casal enquanto conversam. A questão é que, seja apenas um sofá de dois lugares ou uma sala com poltronas, televisões e brinquedos, todas as famílias dão um jeito de se reunir quando existe um lar.



Portanto, concluímos que a arquitetura não pode projetar tudo, afinal ela deixa espaços que devem ser preenchidos por aqueles que usam o projeto e por isso que um projeto nunca se finaliza. Afinal, quando se quer projetar um lar, é preciso deixar um grande espaço vazio para caber todo o afeto que existe entre pais, mães, filhos, avós, tios, animais, amigos, sobrinhos ou qualquer outra configuração, seja grande ou pequena, de todos os tipos de família que existem.

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Imagino como deve ser o mundo para alguém que acabou de nascer, um lugar onde simplesmente e absolutamente tudo que existe é desconhecido, nascer é como aquele filme chamado ‘Na natureza selvagem’ no qual o protagonista decide abdicar da vida urbana para ir viver no meio de uma mata e precisa reaprender coisas básicas como novas maneiras de se alimentar, se entreter e se limpar

Certamente vir ao mundo deve ser muito menos dramático que no filme, no qual o personagem se encontra diante do desafio de literalmente ter que caçar a própria comida, isso porque passamos ao menos uma boa década tendo alguém que vai preparar nosso almoço e nos levar pro banho na hora certa, entretanto todos aqueles sons, cores e texturas novas não existiam no nosso casulo placentário e, portanto, essa primeira mudança de casa traz consigo uma nova maneira de ver a vida, só que sem manual de instruções ou dicionário.

De uma hora pra outra somos jogados aos leões e precisamos achar uma árvore para nos trazer sombra e abrigo, aprendemos logo que, assim como as girafas, precisamos usar nossos novos pescoços para ir atrás da comida (que por sorte vai chegar diretamente na nossa boca e não no topo de uma árvore) mas também que seremos pendurados como macacos nos braços de uma mãe toda vez que chorarmos de dor de barriga. Vamos começar a andar igual patinhos, indo atrás daqueles novos adultos que aprenderemos mais tarde a chamar de pais, mães, avós ou tias e infelizmente não poderemos ser como um flamingo e apenas enfiar a cabeça na terra quando precisarmos passar por alguma situação que não nos agrade. Com o tempo, vamos aprendendo a voar cada vez mais alto e as onças que antes pareciam perigos iminentes passam a ser apenas algo a mais nesse novo mundo que chamamos de casa, nele terão várias cores e plantas novas e teremos que ser cuidadosos para saber aquelas que poderemos comer ou não, com sorte, sempre teremos um adulto pra auxiliar nessa jornada.

Porém o mais interessante de tudo isso é que, mesmo o mundo parecendo uma natureza selvagem, temos bastante tempo para nos adaptar. Ainda que tudo seja novo, bonito e levemente assustador poderemos sempre contar com uma cama quentinha para nos esconder toda vez que as energias de exploração se esgotarem e teremos em nosso alcance milhões de historinhas que serão lidas pelo nosso adulto de confiança, fazendo nossa cabeça viajar ainda mais em mundos que todavia sequer conhecemos. Na pior das hipóteses, quando a agonia for grande, a cadeira de balanço pode tentar imitar nosso casulo-lar, de onde viemos, não para que a gente saia desse mundo, mas para que nos lembremos que nada é tão assustador que não pode ser enfrentado, que as vezes precisamos voltar um tiquinho para nos encontrarmos e poder prosseguir nessa exploração que é a vida.

Apesar de assustador, a vida vai ser um mar de novidades que vai alimentar qualquer mente curiosa e nos fará querer ir cada vez mais longe, até o momento que viremos os reis da nossa própria selva particular. A partir daí, os tigres e onças não serão mais ameaças, saberemos bem que não podemos tocar no porco espinho e os leões servirão como amigos protetores, cresceremos tanto que já não vai mais parecer que estamos desamparados, muito pelo contrário, começaremos a ter saudades de toda aquela aventura que foi viver e iremos estampar isso pelas paredes do nosso novo lar na terra, para nos lembrarmos sempre de como foi demais chegar nesse mundo como um pequeno aventureiro.

Por isso que digo, nascer deve ser a maior aventura de nossas vidas, isso porque quando alguém nasce todos ao redor também renascem. Garcia Marquez dizia que não nascemos apenas quando somos paridos mas que a vida nos obriga a parirmos a nós mesmos outras e outras tantas vezes durante nossa jornada, talvez a selva seja menor e menos assustadora a cada novo renascimento, mas é a vontade de descobrir o que pode ter de novo que nos faz nascer mais uma e mais outra e uma outra vez mais.

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